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Aldo [2]

  • Fernanda Pougy
  • 22 de jan. de 2016
  • 3 min de leitura

Completara seis anos no fim do mês de novembro. Teve festa, vieram os amigos da escola - alguns trouxeram irmãos mais velhos e mais novos -, jogaram bola, pularam na cama elástica, assistiram ao show do mágico e cantaram parabéns para poder comer doce. Agora ele precisava da outra mão para mostrar sua idade. Foi legal usar a mão inteira e mais nada, durante o ano que passou. Precisava se acostumar com a ideia de que, por um ano todinho, terá que se haver com um dedinho solitário da outra mão levantado, até que o segundo venha acompanhá-lo, no ano seguinte.

Mal havia se recuperado de tamanho acontecimento, já anunciaram mais um. Papai decidiu que viajariam juntos, a família toda, para passar o réveillon na fazenda.Todos os tios-avós, tios-normais, primos de sangue, primos emprestados e bichos de estimação iriam também - pensava, animado e preocupado. Levaria o Teo, mas ele não gosta de longas viagens de carro, nem de pessoas desconhecidas que se comportam como conhecidas. Essa parentada toda agia com muita intimidade ao encontrar Aldo, mas ele não se sentia em nada próximo deles. Mal lembrava seus nomes de cor. De coração.

A estrada foi bem, Teo dormiu profundamente, por conta de um comprimido mágico que Mamãe lhe enfiou guela abaixo antes de saírem de casa. Não teve uivo, não teve bagunça no banco de trás, ou insistência desesperada para que Aldo o deixasse meter o focinho pela janela para pegar vento. O menino gostava muito disso, na verdade. Ficou chateado que a mágica funcionou. Em vez de aproveitarem juntos a paisagem que passava correndo, Teo dormiu e deixou o menino Aldo no silêncio dos adultos. Mamãe ouvia música e cantava, mas não conversava. Ás vezes virava para trás e perguntava se ele estava bem, se o cachorro dormia. Sim, sim – e voltava a cantar, com o olhar longe. Papai dirigia sem dar um pio. Depois de pouco tempo, entediado, Aldo dormiu também.

Ficaram todos em um quarto só, com varanda. Aldo gostou bastante da fazenda, viu muitos animais que não costuma ver, andou a cavalo com os primos mais velhos, de carona porque, segundo o Zézinho – peão da fazenda -, ele era muito pequeno para montar sozinho. "No meu sítio também tem um Zé, mas ele não é inho". Contou. Brincou muito e ficou com sono. Dormiu no fim da tarde com o Teo, na varanda. Os adultos estavam muito ocupados com os preparativos da festa de ano novo. Quando Mamãe viu que ele dormia na varanda, brigou. "Já não disse que não é para ir sozinho aí?" Aldo não entendeu porque Teo não servia como acompanhante de varanda. Achou melhor não contestar. Ela o vestiu todo de branco e disse que para receber o ano novo temos que nos vestir assim. Também não entendeu essa parte.

Viu todos os parentes começarem a chegar na parte-festa do jardim. Tinha muita vela e muita flor branca. Todos eles vestiam branco e falavam de planos para o ano novo. Estavam animados. Aldo começou a se sentir ansioso por essa novidade toda. À meia noite ele vai chegar, o ano novo! E quanto mais se aproximava essa hora, mais frequentemente os adultos checavam o relógio, para não perderem o momento exato. Achava divertido e ficava mais ansioso. O ano também ia acompanhar sua contagem de dedos. À meia noite não seria mais 2015, mas 2016 – ele também vai ter que lidar com um dedinho solitário da outra mão.

Começaram a gritar para todos se aproximarem, faltava só um minuto. Teo sumiu no quintal, devia estar comemorando com os outros animais de estimação. Ou dormindo, ele não era muito de se deixar levar pelos planos dos adultos. Estes todos seguravam suas taças compridas com bebida borbulhante que criança não pode. Deram uma menor para Aldo e as outras crianças, com guaraná. Todos tinham que fazer tim-tim à meia noite. O menino esperava, deslumbrado com tanta novidade. Nunca ficara acordado até tão tarde! Essa coisa de ano novo, como seria?

Então começaram a contar ao contrário, porque ia dar a hora de fazer tim-tim. Cinco, quatro, três, dois, um. Tim-tim! Fogos. Muitos sorrisos e abraços. Todos se cumprimentavam e desejavam coisas boas uns para os outros. Abraçou Papai e Mamãe ao mesmo tempo, cada um beijou uma de suas bochechas e falaram “feliz ano novo!”. Aldo ficou muito feliz com isso. Depois brincou um pouco com as outras crianças, atento para uma mudança de ano novo que poderia ocorrer nele a qualquer momento. Não identificou nenhuma e, logo, Mamãe o levou para o quarto e o botou para dormir, pois já era muito tarde para um rapazinho de seis anos. Ela voltou para a festa. Aldo ficou sozinho no quarto e, olhando para o teto, pensou que tinha sido muito divertido esperar o ano novo, mas que se sentia igualzinho ao que era ontem.

[Aldo 1: http://revistahiato.tumblr.com/post/37588698939/9-aldo ]

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