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viste?

  • Maíra Motta
  • 27 de set. de 2016
  • 2 min de leitura

O maravilhoso não é igual em todas as épocas, viste? De repente eu peguei gosto por essa feijoada de campos semânticos, mas até ontem mesmo apostava no sonho da casa própria. É assim, o maravilhoso nunca é igual, só parece: que nem as letras da Legião Urbana; que nem os castanhos dos olhos dela quando viram verdes dependendo da inclinação do dia.

Falta um minuto pra mudar a época, virar o século, o taxímetro, o sexo, esquecer a senha do quarto tumblr e do terceiro cartão de crédito. Falta um minuto para ouvir o homem do apito e rir. Esse apito que mais parece quebra-mola quando sobe e desce o morro do norte de minas e se avista ao longe a fazenda da avó: é sinal que tá chegando. Mirabela! Mira que belo esse riso frouxo e rouco que é o nosso código de games e também meu jeito mais honesto de sentir medo. Não é maravilhoso? Parece igual, mas nunca é.

Falta um minuto pro sol sumir por concreto e eu não saberia nunca te dizer como é a coisa mais linda que eu já vi na vida essa poeira bêbada de luz, duendinhos brancos no happy hour!, essa poeira que já vai desaparecer e que, viste?, pra mim é mais que as forcas de Villon, que as gregas de Racine, que os divãs de Baudellaire. Eu não te disse que aprendi a falar bonito, homi?

Topava esquecer esses nome tudo só pra abrir espaço na memória pro Godofredo entrar. Godofredo, homi!, o sapo que vivia debaixo da pedra do quintal e que o tio garantiu que a língua era tão grande que pegava até criança. Como eu rio frouxo, viste.

Falta um minuto pra mudar a época e, corre! Faz xixi na lua, sai toda molhada, corre pra mudar de roupa, esquece! Só tira a roupa, fica nua, que falta só um minuto pra mudar a moda mesmo. Falta um minuto pra memória derreter inteira e sei lá onde a gente vai parar, homi. Eu, você, o tio, o Godofredo, o quebra-mola donde eu via a fazenda da avó, guarda debaixo daquela pedra!, que falta um minuto pra cidade tomar conta de tudo. Falta um minuto pra Joana Angélica ser vitrine! E foi linda essa cena: 365 maquenís-34 se rebelando em filas por big-macs e coca-cola de 3 litros.

As ruínas do Partenon valem tanto quanto o bonecão do posto sem nome, sacudindo os braços pra tudo que passa. O maravilhoso nunca é igual, viste. Mas é sempre capaz de comover a sensibilidade de qualquer coração,

durante algum tempo.

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