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coelho

  • Maíra Motta
  • 20 de set. de 2017
  • 2 min de leitura

todo dezembro é um derretimento a mais desde que você está na Terra. o ventilador ocupa o meio da sala e venta na velocidade máxima, mas

o que salva também pode ser pouco pro tamanho do calor.

don't blow away, eu peço, finca os pés, abre os dedinhos: eu não danço mais balé, mas os dedos são pra sempre amassados assim, já era, tem coisa que só em outra vida. abre os dedinhos, finca os pés, eu peço, don't blow away.

três da manhã não é hora

de ninguém sumir da vida de ninguém.

a gente sente que é verão quando o corpo derrete sem sol.

-me vê um podrão.

a gente sente que tá podre quando dá nome pras coisas.

-é impossível ser decente comendo um queijo bom.

a gente sente que tá bem quando come um queijo bom.

três da manhã

eu sinto minhas últimas células velhas derretendo.

mais três minutos

e você é inteira uma nova pessoa sem nem precisar nascer de novo, ufa, uma nova encarnação levaria muito tempo. vai levar tempo e pode ser que a gente nem se encontre. pode ser que a gente nem volte

para o mesmo planeta

pode ser que nem haja mais tempo

pode ser que a Terra já tenha explodido

toda feita de pólvora e formiga

mais três minutos

e a última célula velha morre

e você é uma nova pessoa produto

de todo tipo de pensamento que nutriu nos últimos tempos. anda, ainda dá tempo

de ser uma pessoa melhor. pensa positivo, faz um mantra, manda sumir esse nome, anda, fica no Brasil, votar vai ser foda, não pensa nisso, pensa na cor azul, uma bola que cresce e diminui bem devagar, que nem a vida, bem devagar, que nem um sexo bom, bem devagar, que nem o carro quando bate e gira, bem devagar, o vidro quebrando a pele em cicatriz no segundo antes do estrago ser estrago de fato.

já é dezembro e ainda dá tempo

faz só 27 verões que a gente derrete por aqui.

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